No dia 02 de abril de 2022, foi inaugurado, em Cruzeiro do Sul, no Copacabana Shopping, o Memorial João Mariano da Silva, em homenagem ao egrégio jornalista, pai de família dedicado, professor, poeta e rábula. No dia seguinte à inauguração do Memorial, quando se completaram 50 anos do falecimento de João Mariano, foi celebrada, na Catedral de Nossa Senhora da Glória, às 19h30min, e com ampla divulgação pelos meios de comunicação, solene eucaristia “in memoriam” desse nordestino “teimoso” que aqui resolveu casar-se, constituir família e trabalhar diuturnamente pelo desenvolvimento econômico, moral, intelectual, social e cívico de seus contemporâneos.
Um acervo com documentos, jornais antigos, equipamentos de impressão, armário de tipos, poesia e réplica da parte frontal de sua antiga tipografia foi preservado e organizado pela família Mariano e estão expostos nas dependências do shopping supracitado. Esse importante acervo suscitou o interesse da UFAC – Universidade Federal do Acre – em desenvolver um programa de extensão universitária com o seguinte título “Direitos Humanos e a Busca pela Efetivação da Cultura Acreana”. Esse programa está sendo tocado por acadêmicos do curso de Direito e tem sido fundamental para a socialização e expansão do legado material e imaterial de João Mariano. O jornalista dominava a arte de escrever e de falar. Seus textos informativos e formativos bem elaborados e contextualizados revelam um ser humano ético, religioso, inteligente, criativo e solidário com as boas causas sociais.
Desde o dia 21 de junho do ano corrente, alunos representando várias escolas de Cruzeiro do Sul estão visitando o Memorial e sensibilizando-se com a história e a obra de João Mariano. São muitas as perguntas que surgem durante as visitas: “O que levou o jornalista a mudar-se do Ceará para o Acre? Quantos filhos ele teve e quantos estão vivos? Por que ele se tornou jornalista? Existe alguma ligação entre o Juruá Online e o jornal O Juruá fundado por João Mariano? De que ele morreu? Por que ele trabalhava com dois jornais? Quais eram os assuntos que o jornalista abordava nos jornais?”
Foram muitas as perguntas e nenhuma ficou sem resposta. O material jornalístico preparado pela família Mariano é de altíssima qualidade: os jornais antigos foram minuciosamente restaurados, digitalizados e copiados, os equipamentos de impressão foram parcialmente revitalizados em oficina especializada, o armário de tipos, semelhante aos usados por João Mariano, foi um presente da Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul e passou por uma restauração.
Além do vislumbre com o bom estado do material da exposição, o público visitante fica encantado com os conteúdos dos jornais que versam sobre o cotidiano das pessoas a partir de 1921 até 1971: o tipo de alimentação baseada no extrativismo vegetal e animal, o livre consumo de animais silvestres, o comércio de couros; as roupas utilizadas pela população em geral; as escolas existentes, o analfabetismo vigente; os problemas sanitários, as doenças na cidade e nos seringais, vilas, colônias; os remédios utilizados para prisão de ventre, sífilis, dores de cabeça, malária, tosse, as vitaminas, os depurativos, os purgantes…; as peculiaridades da escrita da época; a construção do primeiro hospital, a instalação do hospital dermatológico, a construção de cabanas para os hansenianos; a história da Santa Casa de Misericórdia, suas diretorias; os acidentes geográficos da região; a história do Território Federal do Acre e de nosso município, os personagens que ajudaram a compilar essa história; as casas comerciais mais populares e seus respectivos proprietários, as barbearias, as padarias, os armazéns, os seringalistas da época; as intrigas políticas; os animais soltos que comiam as lavouras e sujavam com esterco as vielas da cidade; a história dos religiosos, padres, bispos, igrejas, pastores; a navegação nos rios da Amazônia e do município; a construção do primeiro aeroporto (Aeroporto Velho), a chegada dos primeiros hidroaviões, o Correio Aéreo Nacional (CAN), os voos da FAB, a chegada da empresa de transporte aéreo Cruzeiro do Sul; a insustentabilidade dos preços da borracha no mercado internacional, a concorrência dos produtores asiáticos e a derrocada dos seringais nativos da Amazônia; a chegada do 7º BEC.
Há que se concluir que seu João Mariano deixou, propositadamente, um legado para as gerações vindouras. Sua preocupação com a educação dos munícipes, a veracidade de suas informações, a cronologia dos acontecimentos e a imparcialidade das críticas revelam o homem visionário, moderado, cristão, pai dedicado, sábio, culto, amigo dos menos favorecidos, seja em termos materiais, seja em termos intelectuais. Sua obstinação por uma educação de melhor qualidade levou-o a sugerir às autoridades locais e estaduais a construção de internatos nas comunidades e vilas remotas a fim de evitar que o homem rural precisasse se deslocar até a cidade em busca de melhores condições de estudo para a sua prole. Dessa forma, o produtor rural, principalmente, não abandonaria sua lavoura, o que era essencial para a segurança alimentar da população.
Para João Mariano, um povo sem educação era um povo sem futuro. Em um de seus jornais, ele relata a discrepância entre os alunos matriculados nas escolas da cidade e os alunos frequentes: os alunos faltosos eram em torno de 40%. Conclama os pais a enviar seus filhos à escola, sob pena de não se resolver os altos índices de analfabetismo e a situação de subdesenvolvimento regional. Lamentava que profissionais das diversas áreas, nascidos no Juruá, estivessem atuando em outros estados/municípios por conta da precariedade de investimentos em áreas essenciais que deveriam ser priorizadas pelo poder público na região. Ele usou a palavra escrita e a palavra falada para defender justiça social, educação de qualidade e respeito aos direitos humanos. Seu João fez a diferença.