Cruzeiro do Sul, Acre, 18 de abril de 2025 17:37

Coluna: Opinião Nauense – Antigo Fórum de Cruzeiro foi revitalizado: justiça com a história

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O lugar respira história. Desde a localização geográfica, em cima de um dos morros mais conhecidos da “capital do Juruá”, à antiga Praça da Armada, hoje Praça João Pessoa, esta erguida de frente ao prédio antigo com um obelisco importante e, que, há muitas décadas tem a honra de cortejar majestosamente o palacete. Jamais poderia deixar de citar o mítico barranco que propicia espetacular visão do imponente Juruá e, afirmo que a edificação não tem “fundos”, pois foi concebida para a sua “frente” ter como desígnio reverenciar o rio e vice-versa, em namoro secular. Quando citei, “mítico barranco”, entenda-se que as lendas fazem parte do lugar.

Quem, em Cruzeiro do Sul, sobretudo, os com mais de 40 anos, nunca ouviram falar da cobra grande, aliás, uma cobra gigantesca que mora há “séculos” em baixo do barranco do antigo Fórum e que quando mexe seu “rabão” ocorrem tremores de terra? Pasmem! Ainda tem quem diga que não é uma serpente. Trata-se de um dragão. Isso mesmo, um daqueles bichos terríveis e lendários. A criatura está adormecida e, como nas fábulas da Idade Média poderá acordar de repente e cuspir fogo sobre a cidade.

O poeta, historiador e escritor Franciney Rocha, ilustre cruzeirense/portowaltense do “pé rachado”, me confidenciou que em suas pesquisas arqueológicas, tudo leva a crer que se trata de um dragão de grande dimensão, de aspecto reptiliano, com asas e o hálito de fogo. Fiquei preocupado, pois trabalho sobre a caverna do dragão. Os saudosistas vão lembrar do ótimo desenho animado dos anos 80.

Feita a apresentação geográfica e outras “verdades” sobre o lugar, passo à história oficial:

“O prédio do antigo Fórum foi erguido pela Comissão de Obras Federais, que enviou mais de 100 operários para Cruzeiro do Sul, no ano de 1907. A construção começou a ser executada ‘pra valer’, em 1908 e foi concluída em 1909, tudo na primeira década do século XX. Quando inauguraram esse edifício, Cruzeiro do Sul contava com apenas cinco anos desde a sua fundação. A Maçonaria existia há dois anos, através da Loja Fraternidade Acreana, o Craveiro Costa era o Inspetor de Ensino e o General Thaumaturgo de Azevedo havia sido transferido para o Rio de Janeiro. Não existia templo católico e nem cais do porto nestas paragens e, nem tampouco, um hospital, que seria inaugurado somente em 1924, com a conclusão dos pavimentos da Santa Casa de Misericórdia. O engenheiro responsável pela obra era o nobre Bueno de Andrada e, este ilustre cidadão, era sobrinho/neto de ninguém mais, ninguém menos do que José Bonifácio de Andrada e Silva, o “patriarca da Independência”.

Concluído em forma de palacete, a sua imponência não foi um fruto de acaso arquitetônico e se deu assim, para ser uma sede administrativa da Intendência da capital do Departamento do Alto Juruá. Dividiram suas salas entre os servidores da prefeitura e do judiciário, mas logo a Prefeitura foi para outro local, próximo do barracão do Seringal Centro Brasileiro e o palacete ficou exclusivamente com o Poder Judiciário. Fato marcante, foi a criação do Tribunal de Apelação de Cruzeiro do Sul, em 1912 e que funcionou nesta Comarca até 1916, quando foi extinto. O Fórum abrigou as unidades da justiça durante mais de 90 anos. Julgamentos, registros de nascimento, adoções, guardas, casamentos, divórcios, legalização de terras, enfim, tudo que envolve a prestação jurisdicional era realizado lá. Desembargadores: Dr. Távora, Dr. Vieira Ferreira, Dr. Pedro Ranzi, Dr. Araken, Dr. Samoel. Ainda, Dr. João Torres, Dr. Santana, Dr. Heitor Macedo, Dr. Jovino, Veras, Jácome, Valdenor “Nôca”, Lindaura Pinheiro, Aldenora, Salvelina, Maurício Melo, Albuquerque, José Martins.

Poderia nominar dezenas de magistrados e servidores que marcaram suas histórias profissionais e de vidas neste lugar, mas ficamos com estes, entretanto, a lista é enorme. Assim, no início do século XXI, cumprida a sua missão como Fórum da Comarca, seu perfil mudou para abrigar o Centro Cultural do Juruá, onde expõe um acervo com objetos de elevado valor histórico para a cidade de Cruzeiro do Sul e região. Há 20 anos, o Centro Cultural vem cumprindo bem o seu papel de ser o guardião do lugar histórico, com realização de eventos culturais, palestras, simulação de júri com estudantes da cidade, pesquisa acadêmica e secundária, recebendo turistas de todos os estados da Federação e até do exterior, com um catálogo diversificado em programações que propiciam entretenimento, cultura e lazer aos visitantes. Completamente revitalizado e, com a obra entregue à comunidade cruzeirense na última quinta-feira (1), a imagem do antigo Fórum voltou a resplandecer, assim como a própria constelação que empresta nome a esta belíssima e imponente cidade do extremo ocidente da grande pátria brasileira.

Nosso agradecimento pela sensibilidade e carinho da Desembargadora Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Acre, Excelentíssima Senhora Waldirene Cordeiro, que em sua gestão à frente do Poder Judiciário acreano, não mediu esforços para revitalizar fóruns, complexos do judiciário e os prédios históricos como o Palácio da Justiça em Rio Branco e o nosso Centro Cultural do Juruá, em parceria com o Governo do Acre e a prefeitura de Cruzeiro do Sul, em nosso caso, em particular. As equipes de arquitetura, engenharia e paisagismo, o nosso reconhecimento pelo competente e singular trabalho executado. Viva o antigo Fórum! Viva o Centro Cultural do Juruá! Viva a cidade e comarca de Cruzeiro do Sul.

*Narcélio Generoso é Técnico do TJAC, escritor, conselheiro de turismo e colaborador do Jornal Voz do Norte