Cruzeiro do Sul, Acre, 12 de junho de 2025 17:24

Documentário longa metragem vai contar história de Maria da Liberdade, a Santa do Rio dos Pássaros, em Feijó

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Maria da Liberdade – A Santa do Rio dos Pássaros é um filme documentário de longa metragem produzido pela Celestina Produções, dirigido por Marcos Vinícius Neves e Rodrigo Campos e financiado através do Edital de Audiovisual Nº 006/2023 da Lei Paulo Gustavo, via Fundação de Cultura Elias Mansour – Acre.

O documentário é a história de três mulheres que nunca se viram antes até embarcar num batelão para subir o rio Envira. Uma longa e penosa navegação até o antigo Seringal Liberdade onde existe a capelinha em que uma santa menina foi sepultada há mais de um século e, desde então, opera graças, curas e milagres misteriosos aos que a ela rogam com fé verdadeira. Conseguirão essas três mulheres, tão diferentes entre si, encontrar – por devoção, necessidade ou desespero – o que buscam? Talvez… quem sabe por milagre…

Até hoje não foram encontrados registros documentais sobre a história da menina Maria que teria vivido no seringal Liberdade, próximo à fronteira com o Peru e às terras onde, ainda hoje, perambulam povos indígenas isolados. Mesmo assim, o que não falta são diferentes “ causos ” e versões contadas e recontadas sobre os diversos aspectos que envolvem a trajetória da menina que se tornou santa aos olhos da fé do povo “ valido ” por ela.

O documentário aborda a extraordinária multiplicidade de histórias que cercam a fé em Santa Maria da Liberdade que, apesar de não ser oficialmente reconhecida pela Igreja Católica possui grande número de devotos na região da cidade de Feijó, no interior do Acre, além de alcançar cidades e rios circunvizinhos.

Conta-se, por exemplo, que pouco depois de sepultada a menina Maria, luzes começaram a ser vistas e se podia sentir um perfume inebriante de flores junto ao seu túmulo. Logo as pessoas começaram a rogar pela ajuda da alma da menina e foram atendidas. Essas histórias cresceram e se multiplicaram tanto que o padre José Fritsh, da ordem dos espiritanos e pároco de Feijó e Tarauacá por muitos anos, foi até lá e exumou o corpo que, para espanto de todos, se encontrava perfeito, incorrupto e, com a justificativa que teria que levar o “ corpo santo ” para Roma, desapareceu com ele.

Andando nas ruas de Feijó ou navegando pelo rio Envira encontramos uma profusão impressionante de relatos de curas e milagres. Muitos deles atestados por ex-votos de madeira – representando partes do corpo que foram curadas –, fotografias de devotos, dedicatórias escritas e deixadas pelos que foram validos pela Santa, tanto na capelinha do longínquo Liberdade, como na Igreja dedicada a ela, erguida por decisão de seus devotos na cidade de Feijó. Sem falar nas muitas meninas chamadas de Maria da Liberdade, por inspiração de sonhos ou de promessa, porque foram salvas de complicações de parto ou de outras enfermidades, por intercessão da Santa que lhes deu nome e graça.

Enfim, uma história comum e ao mesmo tempo, rara. Comum porque enfim, há muitos outros santos populares cultivados por todo o Acre. Almas milagrosas e santos do povo que avivam a fé de famílias sertanejas, que trouxeram essas devoções na bagagem quando, tangidos pela seca e pelo poder dos coronéis, vieram buscar esperança de vida melhor nos seringais da grande floresta amazônica. Comum, ainda, porque se contam tantas e tantas diferentes versões para a morte da menina Maria do Liberdade, que parecem dar conta das múltiplas violências e mortes que ainda hoje atingem muitas outras “Marias” do Acre, o estado com maior taxa de feminicídios do país.

O historiador Marcos Vinicius Neves falou com exclusividade aos portais R7 do Acre e Voz do Norte sobre o ducumentário Maria da Liberdade, a Santa do Rio dos Pássaros, projeto de longa metragem que vai contar a menina Maria que teria vivido no seringal Liberdade, próximo à fronteira com o Peru e às terras onde, ainda hoje, perambulam povos indígenas isolados. Mesmo assim, o que não falta são diferentes “ causos ” e versões contadas e recontadas sobre os diversos aspectos que envolvem a trajetória da menina que se tornou santa aos olhos da fé do povo “ valido ” por ela. O documentário tem como protagonista principal a acreana Gleici Damasceno, vencedora do BB 18.

O historiador Marcos Vinicius concedeu, na tarde desta terça-feira (04), no Hotel Açaí, em Feijó, uma entrevista aos portais Voz do Norte e R7 do Acre, contando sobre o documentário e lembra que no Acre todo tem os santos populares porque a Igreja católica fazia as desobrigas uma vez por ano para fazer os batizados e as missas para aquele povo desassistido.

Historiador Marcus Vinicius Neves com o video-repórter Chiquinho R7

“Tem a tradição nordestina dos santos do povo em que toda pessoa que morre sob injustiça ou violência injustificada, principalmente pessoas inocentes passam a ser considerada almas milagrosas ou santas dependendo do grau de devoção das pessoas. Então, todas as versões da morte de Maria do Livramento, que são muitas, ela pode ter sido morta por um estupro, índios, pelo noivo, pelo irmão ou namorado, são muito interessantes porque contam para nós as maneiras que as Marias acreanas continuam sendo mortas pela violência doméstica, sexual contra a mulher, coisa permanentes e uma raiz cultura de longas datas e só para lembrar que no seringal o seringueiro contraia dívida e tinha que dar a mulher para pagar a dívida. A mulher já era um objeto de troca, não era um ser humano e ainda tem as histórias das índias que eram pegas no laço ou no dente de cachorro que viraram matriarcas de longas linhagens no Acre.

Marcos Vinicius destaca que através da história da Santa do Rio dos Pássaros o documentário consegue tratar a problemática da violência contra a mulher do ponto de vista histórico e cultural, é um problema que sempre existiu apesar de na atualidade já existirem os mecanismos legais de prevenção e proteção como a Lei Maria da Penha e a questão das medidas protetivas com tornozeleira de monitoramento, mas mesmo assim ainda assim continua acontecendo sejam nas aldeias indígenas, ribeirinhos ou mesmo na população da zona urbana.

“Esse é um trabalho de pesquisa que já tem sete anos que vem por etapas. Temos os mistérios relacionados a morte da menina, depois ela é enterrada e começa a exalar perfume na sepultura e nascem flores momento que o povo começa a fazer pedidos e receber milagres. Os padres ficam sabendo que estavam acontecendo dos milagres no túmulo da menina, vão lá no alto rio, cavam e abrem o caixão e ela mesmo tendo sido enterrada há vários anos e seu corpo estava perfeitinho e eles decidem retirar o corpo e levá-lo para Roma e somem com o corpo. Não tem um documento escrito, nada, nada, nada e você sabe que eu vou atrás mesmo e já revirei livros, jornais e não tem nada registrado”, enfatiza.

Segundo o historiador desconfia-se que essa história tenha acontecido no final do século 19 com a chegada da família e sua formação e a morte deve ter acontecido em 1908/1913, talvez e a retirada do corpo por volta de 1920/1930. Eles retiraram mesmo o corpo, não tem mais nada lá. Pelas pesquisas e entrevistas com as pessoas mais antigas, algumas com mais de 90 anos,  descobri o nome do padre Flitz e descobri que tinha um padre em Feijó e Tarauacá um tal padre José Flitz, que era franco-alemão, um personagem que existiu, mas muitos dizem que foi um cardeal ou um monsenhor que veio buscar e levou o corpo num caixão lacrado, ninguém podia chegar perto, com dois vigilantes escoltando com a justificativa que seria enviado para Roma e sumiu o corpo.

“Mas, como me disse o Manoel Jacinto, um rezador antigo de Feijó que faleceu recentemente levaram o corpo, mas não levaram o poder de Deus e o local permanece milagroso, o povo usa o barro do túmulo para passar na pele como remédio para curar ferida braba, tumor queimadura, tem gente que toma banho com aquele barro e alguns até bebem daquele barro e numa época o barro estava lá embaixo. Os milagres são muitos, até de cego que voltou a enxergar”, disse.