Isso corresponde a 5% da população dessas espécies; especialistas ligam mortandade à temperatura das águas de 40°C
Desde que a seca passou a atingir o Amazonas, 110 animais, entre botos e tucuxis (ou pirajaguara, uma espécie de golfinho de água doce), já morreram na região de Tefé, no Médio Solimões. Isso corresponde a cerca de 5% da população dessas espécies, de acordo com o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, organização social vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. A causa da morte desses animais ainda é desconhecida, mas os pesquisadores acreditam que a mortandade está ligada às altas temperaturas das águas, que chegaram a 40 ºC.
A Amazônia sofre com seca extrema, que tem baixado o nível dos rios e dificultado o abastecimento e o transporte na região. A estiagem deste ano é agravada pelo El Niño. O fenômeno climático se caracteriza pelo aquecimento das águas superficiais do Oceano Pacífico na região do Equador. Isso causa a interrupção dos padrões de circulação das correntes marítimas e massas de ar, o que leva a consequências distintas ao redor do mundo.
“A minha impressão é de que tem algo na água, obviamente, relacionado à seca extrema, baixa profundidade dos rios e, consequentemente, ao aquecimento das águas. A média histórica da temperatura da água no Lago do Tefé é de 32 graus e, na quinta-feira, nós aferimos 40 ºC até três metros de profundidade”, diz Miriam Marmontel, pesquisadora do Mamirauá.
Equipes de apoio e resgate de cetáceos vivos chegaram a Tefé no fim de semana. Um barco com piscina está recebendo os animais resgatados com vida. Eles devem ser mantidos nela até que o resultado da análise dos estudos seja concluído. “Aparentemente, é um evento isolado no Lago Tefé”, afirma a pesquisadora.
Especialista em mamíferos aquáticos, Miriam diz que a população de botos e tucuxis no Lago Tefé é estimada em 900 e 500 indivíduos, respectivamente. Ela pesquisa os animais da Amazônia há 30 anos.
“Estamos enfrentando um evento de mortalidade incomum de botos amazônicos no Lago Tefé. Entre sábado e hoje (ontem), perdemos 110 animais”, afirma.
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio), órgão do Ministério do Meio Ambiente, informou no sábado, 30, que vai apurar as causas das mortes de botos. “Protocolos sanitários foram adotados para a destinação das carcaças. O ICMBio segue reforçando as ações para identificar as causas e, com isso, adotar medidas para proteger as espécies”, informou.
O diretor do Instituto Mamirauá, João Valsecchi, diz que a seca também tem causado transtornos para a população, como dificuldade de mobilidade, restrição de acesso a muitas áreas e o aumento do custo de vida. “Escolas estão sendo fechadas, linhas de barcos deixam de funcionar, todos os produtos estão mais caros nas cidades e principalmente no interior e, neste ano, de forma muito atípica, estamos registrando a mortalidade de pescado e botos no Lago Tefé”, afirma Valsecchi.
No sábado, em entrevista ao programa Viva Maria, da Rádio Nacional da Amazônia, um dos veículos da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Miriam disse que esses animais acabam atuando como sentinelas da qualidade da água e são os primeiros a ser afetados com mudanças provocadas no ambiente. “Eles nos deram o alerta e agora tem de ficar atento a isso. A tendência, se não mudarmos nossos hábitos, é que esses eventos vão continuar, mais aquecimento global, mudança nos parâmetros climáticos”, disse.
Barco com piscina Equipes de apoio e resgate de cetáceos vivos chegaram a Tefé no fim de semana e usam piscina em socorro
A SECA AVANÇA
O Amazonas decretou situação de emergência na sexta-feira após 55 municípios do Estado serem prejudicados pela seca que atinge os rios da região. Em entrevista à Rádio Eldorado, o professor da Universidade Federal do Acre José Genivaldo Moreira, doutor em Saneamento, disse que o fenômeno El Niño está entre as causas da seca, que deve ir até meados de novembro e se repetir em 2024. “Estamos fazendo ações paliativas.”
A Santo Antônio Energia informou nesta segunda-feira que, por causa dos baixos níveis de vazão registrados atualmente no Rio Madeira, aproximadamente 50% abaixo da média histórica, interrompeu excepcionalmente a operação da Hidrelétrica Santo Antônio, localizada em Rondônia, em alinhamento com o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). A usina tem capacidade instalada de 3,5 mil MW. •