Cruzeiro do Sul, Acre, 12 de julho de 2025 04:43

Escândalos começam a abalar o apoio a Bolsonaro e preocupam aliados para eleições de 2024

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Diversos estudos nos últimos dias indicaram que caso das joias causou incômodo em eleitores do ex-presidente no momento em que se ampliam as costuras para o ano que vem

A intensificação das investigações e revelações envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seu entorno, sobretudo no episódio das joias sauditas desviadas e comercializadas nos Estados Unidos, vem causando fissuras no apoio ao ex-chefe do Executivo como nenhum outro caso até aqui conseguiu desde que ele saiu da Presidência da República. Dados de diferentes tipos de sondagem indicam que ao menos uma parcela dos eleitores que apoiam Bolsonaro começa a se incomodar com as notícias, reconhecendo sua responsabilidade ou até pedindo sua investigação. No momento em que as conversas com vistas às eleições municipais do ano que vem se aceleram, o enfraquecimento de seu nome é notícia péssima para aqueles que trabalham com a vinculação ao capitão da reserva para alcançar bons resultados na disputa.

Essa rachadura no apoio de Bolsonaro foi mostrada, por exemplo, por uma pesquisa feita pelo instituto Opinião, encomendada pelo portal Congresso em Foco e feita com 2 mil pessoas entre os dias 16 e 19 de agosto em todo o país. O instituto mostrou que 61,7% dos brasileiros acham que Bolsonaro tinha conhecimento do esquema de venda de joias no exterior. Apenas 18,1% acham que ele não tinha, enquanto 20,2% não souberam ou não opinaram. A percepção de que Bolsonaro sabia do esquema é compartilhada, inclusive, por 25% de seus eleitores (os outros 43% acham que não e 32% não responderam).

Além disso, segundo dados do mesmo instituto, 51,4% dos brasileiros acham que Bolsonaro é o responsável pelo esquema. Neste caso, 6% dos eleitores de Bolsonaro acham o mesmo e 31% deles não souberam ou não responderam. Assim, são 63% os eleitores do ex-presidente que saem efetivamente em sua defesa, dizendo que ele não tem responsabilidade alguma.

Eleitorado de Bolsonaro dá sinais de incômodo com caso das joias, enquanto ex-presidente ainda não conseguiu emplacar uma narrativa que lhe permita escapar da perda de apoio em meio a discussões para as eleições de 2024. Foto: Wilton Junior / Estadão

Quando analisados os dados de popularidade do governo Lula, medidos na mesma pesquisa, o apoio convicto a Bolsonaro também mostra sinais de que está cedendo. Assim, apenas 30% dos brasileiros hoje acham que o mandato atual é pior do que o anterior, enquanto 54% preferem o de Lula e 9,9% acham que é igual. Mesmo entre os bolsonaristas, há 13% que acham que Lula está indo melhor e 12% que veem o governo como igual. Os que continuam preferindo Bolsonaro são 66%. E a aprovação de Lula, que chega a 59,7% pelo instituto, já alcança 22% entre os bolsonaristas.

O estudo também mostrou que 11% dos eleitores do ex-presidente em 2022 se arrependeram da escolha, dizendo hoje que optariam por outro candidato ou anulariam o voto. Somando ainda aí os 13% que não quiseram se manifestar, sobram apenas 76% dos eleitores bolsonaristas dizendo de forma convicta que manteriam seu voto dado na urna no ano passado.

Outro estudo que mostrou o impacto da operação da semana passada no caso das joias veio do instituto Quaest. Bolsonaro despencou no Índice de Popularidade Digital (IPD), que analisa mais de uma centena de variáveis nas redes X (antigo Twitter), Instagram, Facebook, Youtube, Google e Wikipedia. No dia seguinte à operação Lucas 12:2, o ex-presidente viu seu índice que varia de 0 a 100 cair de 35,39 para 23,85.

Reclamações e desconfiança entre eleitores que apoiam o ex-presidente

Não são apenas os dados quantitativos que ajudam a entender o impacto do escândalo para o ex-presidente. Uma análise qualitativa com 36 eleitores do presidente pelo Monitor da Extrema Direita (MED), desenvolvido pelo Laboratório de Estudos da Mídia e Esfera Pública (LEMEP), sediado no IESP-UERJ, indicou fissuras no apoio. Esses bolsonaristas são monitorados e entrevistados periodicamente desde abril. A maior parte continua defendendo o ex-presidente e muitos até culpam o PT pelo escândalo. Mas alguns deles já se mostram mais desconfiados de Bolsonaro, o que não vinha aparecendo em relatórios anteriores.

“Em se tratando de presentes adquiridos pelo chefes de Estado, têm que ser analisados cuidadosamente pra não cometermos nenhum equívoco. Os presentes apontados na enquete me parece que foram adquiridos em visitas oficiais e em se tratando de presentes recebidos em visitas oficiais ou em cerimônia oficial, são considerados patrimônio público por tanto de interesse público. Com certeza muitas pessoas tentaram se beneficiar, e um deles foi o ex-presidente Bolsonaro, e não tiveram sucesso”, disse no estudo um administrador de 47 anos de Goiás que votou no presidente.

“Apesar de ter votado no Bolsonaro, está mais claro que nunca que ele foi o beneficiado assim sendo deve responder penalmente por esse crime. Pois está muito claro a sua participação no devido delito”, afirmou um gerente sênior de 54 anos do Pará.

“Agora só existem especulações, sem apresentação de provas concretas. Mas se aparecer mais provas de que ocorreu mesmo, deve ter punição sim para o Bolsonaro. No fundo eu acho que ele tá envolvido, sim, nisso. Ele e a Michele”, admitiu um comerciante de 43 anos de Tocantins.

Revelação do caso do Rolex vendido por Mauro Cid (foto), ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e recomprado por Frederick Wassef, advogado do presidente, tornaram defesa mais difícil. Foto: Geraldo Magela/Agência Senado e Acervo Estadão

Tanto os dados desses estudos quanto a interpretação do momento feita por quem está no meio político indicam que, em razão da abundância de provas e do quão palpável é o caso das joias, está bem mais difícil ao bolsonarismo emplacar uma narrativa convincente que sustente a tese da perseguição do Judiciário. O caso da fraude da vacina foi tratado como uma banalidade. O 8 de janeiro, como uma armação de governistas ou como uma legítima manifestação de insatisfação. O ouro e os diamantes de relógios brilhando, o recibo de recompra e as mensagens trocadas parecem bem mais fáceis de compreender e difíceis de refutar, o que ajuda a explicar a mudança gradual do quadro.

Enfraquecimento em meio a debates para 2024 geram preocupação

Embora ainda modesta, a corrosão do apoio a Bolsonaro que sugerem dados e análises qualitativas preocupa seus aliados, já que começa no momento em que se intensificam as conversas sobre as eleições de 2024. Em muitos lugares, onde o apoio a Bolsonaro já não era tão maciço, o presidente vai se tornando uma figura tóxica. Isso coloca muitos políticos, sobretudo na centro-direita, em um dilema: abrir mão de um apoio que daria tanto tempo de televisão por meio do PL e que neutralizaria o surgimento de um concorrente à direita que poderia esmagá-lo em meio à polarização ou suportar o impacto negativo de aparecer ao lado de um multi-investigado que, em 2024, pode estar bem mais fraco do que hoje?

Para alguns deles, esse processo de perda de fôlego gradual é o pior cenário, justamente pois não permite uma decisão definitiva, sob risco de o bolsonarismo, que ainda representando algo em torno de 30% a 35% do eleitorado, poderia estar em peso em um palanque com boas chances de levá-lo ao segundo turno. O caso de Ricardo Nunes, prefeito de São Paulo, é emblemático nesse sentido. Ele não pode abrir mão, no momento de buscar apoio do ex-presidente. Se o esvaziamento do bolsonarismo fosse mais rápido, o descolamento seria natural e com menos riscos de criar um novo adversário.

Para Bolsonaro, mais do que o cálculo de 2024 está também o da liberdade. Aliados têm certeza de que ele só não foi preso ainda pois seu tamanho na sociedade tornaria sua prisão politicamente arriscada atualmente. Mas a cada nova revelação, esse escudo que protege o ex-presidente vai ficando mais frágil.